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"Just because someone stumbles doesn’t mean they lost their way"
O sétimo filme da saga de mutantes criada originalmente por Stan Lee e Jack Kirby chega às salas portuguesas com a missão de galvanizar e reorganizar a cronologia de acontecimentos dos títulos precedentes.
Dada a soberania atual na bilheteira, é fácil esquecer que o género dos “Super-Heróis” foi um dia uma verdadeira maçã envenenada. Estávamos nas décadas de 80 e 90, e tudo o que pairasse no âmbito do sobre-humano com toques de Deus estava destinado à escória de uma carreira medíocre.
O jogo mudou, como que espelhando a viragem do milénio, no ano 2000, com o lançamento de “X-Men” de Bryan Singer (e posteriormente de “X2”, em 2003), que não só veio insuflar o peito e desobstruir as artérias da espetacularidade de um género esquecido, como, sobretudo, passou a utilizá-lo para explorar analogamente temas de importância social, cultural e política. A estética e abordagem de Singer pavimentou o caminho que hoje conhecemos habitado por Homens-Aranha, Vingadores e Cavaleiros das Trevas reinventados, sem no entanto se deixar despersonalizar pelo caminho.
Como no trilho da banda desenhada, e como na estreia que reinventou o género para o Cinema, X-Men continua em “Days of Future Past” a demonstrar porque é, provavelmente, o mais reconhecível e vultoso grupo de super-heróis alguma vez criado.
Inspirando-se parcialmente no lendário arco da banda desenhada homónima de 1981, Singer e o argumentista Simon Kinberg reúnem as personagens da trilogia original e as suas versões mais jovens da prequela de 2011 “X-Men: First Class”, levando o icónico Wolverine ao passado para remediar alguns erros que tiveram repercussões nefastas no futuro.
Como sempre esteve patente na saga, há um nível de contenção que é especialmente respeitado quando Singer está ao comando, e que edifica a possibilidade de um mero orgasmo de explosões e efeitos visuais se transformar numa história forte e ambiciosa que representa uma entusiasmante parábola sobre o medo, a esperança, o poder destrutivo do vício, a discriminação e o abuso do poder, evocando atrocidades do passado da Humanidade.
O espírito negro e socialmente consciente de “Days of Future Past” proporciona uma abordagem que traça vincados paralelos com as contendas civis, étnicas e sociais do mundo real, o que torna este um filme de super-heróis atipicamente relevante para a audiência. Ocasionalmente, todavia, sente o peso de conciliar tantas personagens, acontecimentos e linhas do tempo, acrescendo-se ainda a continua dificuldade do universo em criar um antagonista humano (ou mesmo um retrato da raça, em termos gerais) credivelmente complexo.
No elenco – que é inequivocamente o maior e melhor alguma vez reunido num blockbuster – James McAvoy é particularmente tocante como o assombrado Charles Xavier. O caminho negro e monstruoso de Magneto é peculiarmente prazeroso de acompanhar, cortesia de Michael Fassbender, enquanto o conflito interior de Jennifer Lawrence e a sua Mystique ditam, literalmente o futuro. Ainda numa nota positiva – uma vez que grande parte do elenco retornado pouco espaço tem para brilhar – vale a pena referir a excecional (ainda que infelizmente curta) participação de Evan Peters como Quicksilver, que protagoniza uma das passagens mais bem conseguidas e divertidas num assalto surpresa ao Pentágono.
Parte da vida que se sente infundida na saga deve-se, em grande parte, ao compromisso do elenco em tratar o material de forma tão séria e dedicada. São sentimentos como o medo, a dúvida e a dor que guiam as suas motivações, e é isso que torna a dimensão emocional do material tão real e crua.
A saga X-Men tem sido qualitativamente inconstante, mas “Days of Future Past” consegue não só limpar muita da desarrumação e sujidade deixada por “X-Men: The Last Stand”, como estabelecer-se como uma das mais entusiasmantes entradas no género dos últimos anos. A estandardização e habituação tem-nos ensinado a esperar bons efeitos especiais, piadas irónicas, protagonistas carismáticos e enredos delgados relativamente resistentes ao escrutínio... contudo, e a cada punhado de anos, surge um filme que nos relembra o quão complexo e recompensador o género pode ser.
A certa altura dos desenvolvimentos, Xavier suplica ao seu Eu da juventude imatura: “precisamos que tenhas novamente esperança”. Foi isso que “First Class” começou por nos pedir, e é isso que “Days of Future Past” se esforça por nos assegurar.
E agora, mirando um novo futuro moldado pela expectativa em tantas novas e excitantes histórias ainda por contar, acreditamos.
8.5/10
E a diarreia promocional de "X-Men: Days of Future Past" continua, agora com 12 novos stills da sequela de "X-Men: First Class".
"The choice is yours. Do you want to remember or do you want to forget?"
Depois de uma semana de trabalho incessante, o film noir resolveu investir na loucura por uma noite: ingeriu uma generosa quantidade de LSD e entrou confiante numa turbulenta rave que tinha lugar ali ao lado.
Expondo-se a horas de uma frenética harmonização entre música eletrónica, luzes néon e dança desvairada, eis que veio ao mundo “Trance”.
Criador compulsivo de cinema inesperado, Danny Boyle retira um prazer imenso da navegação pelos vários géneros e linguagens cinematográficas, oferecendo-nos uma coleção eclética de títulos que vão desde o frenético “Trainspotting”, ao aterrorizador “28 Days Later” e da ficção científica de “Sunshine”, passando pelo bollywodesco “Slumdog Millionaire” até à saga do antebraço decepado em “127 Hours”. Na verdade, é com segurança que dizemos que nunca fez um mau filme – ou um mau espetáculo Olímpico, já que falamos nisso.
Desta feita, o ataque é posicionado, aparentemente, ao heist movie.
James McAvoy interpreta Simon que nos introduz ao mundo dos leilões de arte através de um discurso em voice-over sobre as características específicas do seu trabalho, e como este foi afetado pela onda de assaltos que se foi desenvolvendo ao longo dos anos. Rapidamente percebemos que o primeiro truque foi acionado, e Simon não é apenas um leiloeiro de arte, mas parte integrante de um gang com o plano de roubar um valioso quadro de Goya.
Um imprevisto durante o assalto resulta numa forte agressão na cabeça que o deixa inconsciente, e é esta pancada, muito como o soar de um gongo, que altera daí para a frente todo o curso da ação. Agora, Simon não consegue lembrar-se onde escondeu o quadro, nem mesmo depois de uma violenta sessão de ‘manicure tortuosa’ oferecida pelos obedientes serventes de Franck, o líder do grupo.
Desesperado por reaver o quadro, o líder propõe a Simon que escolha uma hipnoterapeuta para o ajudar a recordar-se da localização exata do quadro – introduz-se Elizabeth Lamb, uma presença enigmática que rapidamente descobre os verdadeiros intentos do novo doente e força Franck a aceitá-la entre o grupo para ajudar Simon a recuperar a memória.
E aqui se inicia a descida gradual até ao delírio, sobre o qual nada mais se revelará, não só porque Danny Boyle pediu encarecidamente aos críticos de cinema para não estragarem os twists de “Trance”, mas especialmente porque era impossível fazê-lo sem autoinduzir uma hemorragia cerebral semelhante àquela que seria necessária para explicar, por hipótese, “Mulholland Drive” de David Lynch ou, ainda mais, a série “Lost”.
A ideia de partida do argumento é simples, mas é depois projetada pelo prisma do inconsciente, desaguando depois sob diversas formas, na vida, emoção, personalidade e memória de Simon.
Posto isto, e sem ser capaz de assumir um ou outro extremo da corda bamba, “Trance” fica a meio caminho de ser uma obra de arte absoluta, mas também de ser um desastre completo – se por um lado somos assaltados por uma onda de pequenos orgasmos sensoriais, também é verdade que o filme de Boyle acaba por se sentir muito limitado no alcance emocional e ponto de ligação com o espectador, sendo mesmo frio, talvez perdido no meio de twists e cambalhotas no enredo que acabam por se tornar excessivos – com apenas um visionamento é, inclusive, impossível constatar se todas as pontas soltas são envolvidas no resto da história, ou se ficam ali a cambalear sozinhas num limbo alucinatório.
Eventualmente torna-se óbvio que nem a história nem os personagens conseguem suportar a condução prodigiosa mas totalmente louca de Boyle. A receção divisiva é ponto tomado como certo entre a audiência.
Todavia, o cartão-de-visita do entretenimento é solidamente preenchido, e do ponto de vista técnico, “Trance” é mesmo um pedaço de Cinema enviado dos céus, temperado generosamente com estilo, sensualidade e energia, bastante familiares na filmografia de Boyle - um autêntico banquete para os olhos e ouvidos: de um lado, a incrivelmente cinemática e dinâmica fotografia digital de Anthony Dod Mantle, do outro a banda sonora sugestiva de Rick Smith que forma o ritmo fundamental do filme e que, entre criações originais, oferece ainda contribuições ecléticas de Moby, Art & Dotty Todd, M People e Kirsty McGee.
Adicionalmente, temos de louvar o trabalho de montagem de Jon Harris que nos submerge num estado permanentemente controlado de pura desorientação.
No campo das representações, enquanto Vincent Cassel nos delicia com mais um dos vilões que sabe criar tão bem, McAvoy oferece mais uma das suas performances intensas (ainda que a personagem não seja particularmente empática). Todavia, é Rosario Dawson que acaba por roubar o show, com uma interpretação angulosa e cheia de pequenos pormenores. É bastante raro para uma mulher conseguir um papel como este, muito menos num thriller baseado no mundo do crime.
Várias comparações foram traçadas entre o filme de Boyle e “Side Effects” de Steven Soderbergh, estreado entre nós em março passado, e é fácil compreender porquê: começando como filmes completamente distintos daqueles como terminam, ambos tomam enorme deleite em puxar violentamente o tapete debaixo dos pés da audiência. Paralelamente, são ainda veículos criados para exibir vistosamente os dons de cada realizador, e no caso de Boyle a exuberância cinética é quase ela mesma uma obra de arte.
No final o techno noir faz-nos partir de olho cheio mas coração vazio, como resultado de um puzzle que acaba por valer mais pela soma total, do que pela coleção algo inconsistente das partes, apresentando-se como um filme manipulativo que prefere a emancipação do estilo em favor da substância.
Mas se assim mesmo tiver de ser, mais vale que seja um mestre como Boyle a determinar o estilo.
7.5/10
Quando pensamos em obscenidades e coisas politicamente incorretas, não é costume associarmos James McAvoy ao mesmo pensamento. Um ator escocês respeitável, com ares de bom rapaz e uma carreira promissora, povoada de personagens respeitáveis... pelo menos até 2013 que é, até ver, o seu ano mais preenchido e diversificado.
Depois de "Welcome to the Punch" e "Trance", McAvoy tem alinhado o surpreendente "Filth", uma comédia dramática adulta realizada por Jon S. Baird.
Desta feita, McAvoy interpreta Bruce Robertson, um polícia viciado em sexo, drogas e má vida que fará tudo para ser promovido, tentando resolver um crime horrendo e capturar os culpados. Todavia, as suas mentiras, manipulações e vícios empilham-se rápida e perigosamente, colocando em rota de colisão os seus colegas de profissão e pondo em perigo a sua relação com a mulher e a filha.
Quanto ao trailer, promete boa dose de devassidão, nudez, libertinagem, ofensas verbais, entusiasmo e um elenco de luxo a acompanhar McAvoy - Jamie Bell, Eddie Marsan e Jim Broadbent.
A Fox Searchlight Pictures revelou o poster oficial da próxima longa-metragem de Danny Boyle, "Trance".
O thriller protagonizado por James McAvoy, Rosario Dawson e Vincent Cassell, traz-nos a história de Simon, um historiador de arte que, em parceria com uma quadrilha liderada por Franck, planeia o roubo audacioso de uma obra-prima de Goya num leilão público. Durante o assalto, Simon começa a questionar a quadrilha, e Franck chega a agredi-lo com violência, deixando-o inconsciente. Depois do assalto, Simon afirma que o trauma violento lhe apagou a memória, sendo agora incapaz de recordar onde escondeu a obra de arte. Sem conseguir obter a localização da pintura, Franck e seus parceiros tentam recorrer a uma carismática terapeuta na tentativa de fazer o historiador falar. Mas na jornada mais profunda pela psique, Simon confunde as fronteiras entre realidade e sugestão hipnótica.
O trailer oficial do novo filme de Danny Boyle também foi lançado este mês e acompanha o mood do poster e da própria filmografia do realizador: visuais vivos e "ação cinética" para dar e vender.