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Point-of-View Shot - Gone Girl (2014)

por Catarina d´Oliveira, em 05.10.14

 

"I can practice believing my husband loves me. But I could be wrong."

 

Capaz de fazer gelar a espinha mais bem constituída, “Gone Girl” é um mistério polido que tem tanto de ultrajante como de assustador, continuando a incursão de David Fincher pelos mais escuros meandros da condição humana.

 

Amy e Nick vivem um romance tirado dos contos de fada e dos versos das músicas. A fórmula para o entusiasmo interminável parece selada por jogos entusiasmantes e uma promessa sussurrada entre paredes: “nunca vamos ser um daqueles casais”. Mas porque o mundo não é cor-de-rosa – uma cor literal e figurativamente ausente dos universos criados por David Fincher – a recessão atinge a economia, e ambas as crias do brilho nova-iorquino encontram-se subitamente sem emprego e obrigadas ao retiro para a terra natal de Nick, no Missouri.

 

 

O fulgor cansa-se, os defeitos interessantes tornam-se fraturas dilacerantes, e em pouco tempo, Nick e Amy têm entre si uma rutura inescapável de distância e alheamento. No dia do seu quinto aniversário de casamento, Nick prepara-se para a deixar. E é nessa altura que, numa casa antes imaculada e agora surpreendentemente revirada, Amy desaparece.

 

Pode não ter o peso de “Zodiac”, ou a vitalidade de “Se7en”, ou a complexidade de “Fight Club”, mas “Gone Girl” é uma imperiosa e negra criatura da noite, como uma serpente venenosa, esguia e pronta a abocanhar uma presa insuspeita.

 

A adaptação do best-seller homónimo de Gillian Flynn conta uma história sórdida entre várias camadas de ilusão, mentiras e frenesim mediático; uma história que se alicerça no poder do storytelling (tanto no próprio enredo, como nos utilizados mecanismos para o trazer à vida) e na eterna contenda entre a perceção e a realidade.

 

 

Sagaz, cáustico e perverso, parte como uma exploração fascinante sobre narrativas duvidosas e do poder escorregadio dos media, capaz de agarrar ideias profundas sobre a identidade pessoal, a forma como nos apresentamos perante o outro e as relações, e transpô-las para um enredo metafórico que serve totalmente as necessidades de entretenimento do público moderno. Além de tudo isto, o mais recente filme de Fincher é ainda um assombroso ensaio sobre a misoginia, as dificuldades de distanciamento da educação que recebemos, a relação com cenários de crise e a anatomia de um casamento corrosivo - está para o casamento como “Fatal Attraction” está para a infidelidade.

 

Surpreendentemente, este é uma das entradas com mais humor da carreira do realizador, que aqui não só corta a escuridão como um facalhão de gume afiado, como também cria um contraste satírico fascinante com esta. “Gone Girl” é perverso, e perversamente divertido, e o respeito pela inteligência da audiência volta a ser um dos trunfos de Fincher – aqui em particular, já que é da maior importância que cada membro do público seja júri, juiz e carrasco num tabuleiro onde a perceção e a depreensão são tudo. Mas parte da razão do seu sucesso jaz no triunfo das performances dos intervenientes.

 


Apesar de ser notoriamente um ator limitado no alcance, Ben Affleck cruza-se aqui com uma das melhores interpretações da sua carreira, emanando, entre várias nuances que podem não saltar imediatamente à vista, uma empatia natural mesmo quando esta se equilibra com uma irritante quantidade de estupidez e negrume questionável.

 

Todavia, o relevo das letras gordas pertencerá sempre a Rosamund Pike, que com uma carreira sólida em papéis secundários segura com unhas, dentes e veneno a sua grande oportunidade de saltar para a primeira linha de Hollywood. Pike é uma revelação, e nenhum dos seus trabalhos precedentes nos preparava para o que aqui se mostra capaz. No filme de Fincher, ela bem pode ser a mulher desaparecida, mas Pike veio mesmo para ficar.

 

Contas feitas, esta é uma história sobre jogos. Os jogos que jogamos uns com os outros para obter a dianteira; os jogos que os media jogam connosco para obter audiências; os jogos que nos fogem por entre os dedos quando tudo o que procuramos é o seu controlo.

 

 

“Quem sou eu?” – é a questão central que faz girar em torno de si as narrativas mais convencionais. Mas o filme de Fincher apresenta uma inquisição muito mais misteriosa e potencialmente aterradora – “Quem és tu?”. Com respostas perturbadoras a perguntas incómodas, não oferece nada incrivelmente novo ao impressionante repertório do realizador, mas não deixa de surgir como um trabalho de fascinante engenharia, inteligência arrepiante e metáfora lúgubre. No entanto, poderá existir uma determinada compulsão em fazer de “Gone Girl” algo que não é. Aceitá-lo como outra coisa que não um thriller entusiasmante e sarcástico é manifestamente um desserviço.

 

Apresentado em serviço de prata e porcelana chinesa, é um cheeseburger que mereceu tratamento gourmet, e esta é, talvez, a verdadeira raiz da sua genialidade – porque veste impecavelmente a camisola da sátira que representa.

 

8.0/10

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Snorricam - Fight Club, em 8 bits

por Catarina d´Oliveira, em 10.03.14

A primeira regra do Fight Club é que nunca podes falar do Fight Club. A segunda não é muito diferente. Mas entre o arraial de mandamentos, não me lembro de ver nada a contraindicar a criação de uma versão 8-bit do filme/livro.

 

 

E ainda bem.

 

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Master Shot - Filmes que Originaram Jogos

por Catarina d´Oliveira, em 18.03.13

Mergulhei no baú das recordações para relembrar alguns dos jogos baseados em filmes mais… peculiares… da história. Nem sempre necessariamente maus – ainda que às vezes sejam mesmo péssimos – esta é uma compilação de jogos inspirados em filmes insuspeitos que acabaram por marcar a indústria (ou as nossas memórias) indelevelmente.

 


 

“Fight Club”, um dos grandes filmes de culto das últimas décadas… não propriamente o material mais óbvio para um jogo, mas ainda assim, passível de ser transformado num veículo engraçado de execução do Project Mayhem, por exemplo.

 

Mas as fabulosas mentes criadoras por de trás de “Fight Club - Videogame” acharam que sabiam tudo da vida e do enredo a olhar para o nome do filme. Assim, o que acabámos por receber foi uma versão pechibeque de Street Fighter/Mortal Kombat com tipos fininhos ou barrigudos a lutar sem razão aparente em casas de banho e becos manhosos.

 

 

E o jogo é de 2005, portanto não venham com tretas – ao menos os gráficos podiam ser qualquer coisa de jeito.

 

Pontos extra (negativos): Abraham Lincoln é uma das personagens desbloqueáveis, ao lado de… Fred Durst. Esse mesmo, o vocalista dos Limp Bizkit… curiosamente, o exato tipo de “ícone” consumista que o filme critica.

Pontos extra (positivos): A representação dos seios de Bob é bastante precisa.

 



Não é que seja propriamente mau… mas é só esquisito alguém ter-se lembrado de criar um jogo para “The Breakfast Club”, onde o objetivo é apanhar maços de tabaco para salvar a Claire e fazer com ela... o amor.

 

Jogar online aqui

 

 

 



Parece um padrão manhoso, alvo de uma qualquer macumba pouco própria, este que permite que os jogos baseados em filmes de Steven Spielberg sejam tão medonhos. Não contente com apenas um jogo passível de arruinar a sua imaculada reputação como o “primeiro blockbuster oficial de Hollywood” e grande filme de terror, “Jaws” tem dois jogos a trabalhar nesse sentido.

 

 

O jogo de 1987 lançado para NES coloca-nos a conduzir um barco ao caso, ocasionalmente a chocar com coisas e a nadar de um lado para o outro, evitando sermos comidos por um tubarão que vários jogadores dizem nunca ter visto.

 

 

Quase 20 anos depois, os saltos tecnológicos e despedimentos de profissionais que preferiam dormir enquanto criavam jogos faziam adivinhar um futuro menos funesto a “Jaws Unleashed”, lançado em 2006. Aceção novamente errada – além dos controlos horríveis e câmaras que só dava vontade de pontapear, apesar desta vez nos permitir tomar controlo do “vilão”, este desenvolveu algum tipo de consciência que só lhe permite fazer matar pessoas más e trazer a paz ao mundo… mas o tubarão tem sempre muita larica.

 

 




Depois a Enorme obra de Victor Hugo fazer sucesso nos palcos e nos Cinemas, já estava mais do que na hora de o fazer no mundo dos jogos – sobretudo tratando-se de um jogo de pancadaria.

 

O jogo chama-se "Arm Joe", e é japonês – o nome deve-se ao facto de, naquele país, “Os Miseráveis” serem conhecidos como “Aa Mujou”. O jogo foi criado para PC e obviamente não é um produto oficial – parece mesmo caseiro. Aliás, por falar nisso, quando perguntaram ao seu criador porque é que passou cinco anos a desenvolver o jogo, ele respondeu: “porque não tenho amigos”.

 

 

Mas quem liga a isso quando pode engajar-se em festivais de pancadaria entre Valjean, Javert, Marius, Eponine e especialmente Cosette?

 

Pontos extra (negativos): Todos os personagens falam… menos Marius, por alguma razão desconhecida.

Pontos extra (positivos): Os personagens têm poderes e aparentemente o Javert consegue conjurar meteoritos em forma de Kamehameha.

 

 





Não é, em rigor, um jogo sobre o clássico de Stanley Kubrick "2001: Odisseia no Espaço", mas é uma complexa e impressionante combinação deste com o popular jogo Tetris. O objetivo é criar um monólito com as peças pretas.

 

Pontos extra (positivos): Durante o jogo, passam cenas e banda sonora do filme em pano de fundo.

 

Jogar online aqui

 



 

É comummente considerado o pior jogo baseado num filme de sempre, e voltamos a encontrar Steven Spielberg na lista, desta feita com “E.T.”, para a Atari 2600. O pai e a mãe dos flops dos “movie games”. Na verdade, não é um jogo, é um teste de resistência, e é tão pavoroso que chega a ser apontado por muitos como uma das principais razões da enorme recessão que atacou a indústria de jogos entre 1983 e 1985, e que levou, inclusive, à falência da Atari, prevalecendo a lenda urbana de que apenas 1,5 milhões dos 4 milhões produzidos foram vendidos, sendo milhares deles enterrados num aterro no Novo México.

 

 

Pontos (positivos): não há; mas se pensarmos que o criador do jogo só teve cinco semanas para o desenvolver (por obrigação de o lançar no Natal de 1982), quase não parece assim tão mau. Mas é.

 

 

 

 


 

Partir do conceito de um jogo que é baseado num filme que ainda por cima é mau, que por sua vez, é baseado num jogo com e celebrado, parece uma ideia palerma, destinada a resultados dolorosos e cancerígenos para gamers por esse mundo fora.


 

Infelizmente, ninguém se pôs à frente do camião da morte, e a ideia diabólica concretizou-se mesmo, em 1995.

 

 



Para provar que não só os jogos antigos que são marretas, revisitemos “The Hunger Games Adventures”, que com a potencialidade de aproveitar uma mina de ouro na indústria dos jogos, tem uma criação aborrecido, repetitiva, pouco, ou alias NADA original para iPhone/iPod/iPad/Facebook.

 

 

Pontos extra (negativos): é uma versão rasca do farmville.

 

 



Mais uma vez, é a lógica tripartida (começa num livro, passa pelo filme e culmina no jogo), mas serve para o propósito.

 

Em 1990, o clássico de F. Scott Fitzgerald, que até ao momento teve a sua versão cinematográfica mais relevante na versão de 1974 realizada por Jack Clayton, recebeu o tratamento pixelizado por cortesia de Charlie Hoey e Pete Smith, que passaram um ano inteiro a desenvolver o jogo. No enredo, tomamos a parte de Nick Carraway em busca do sonho americano, sempre acompanhado do seu chapéu boomerang mortífero.

 

Pontos extra (positivos): Os criadores do jogo deixaram-no em open source para que outros programadores o possam alterar ou adaptar se assim desejarem.

 

Jogar online aqui

 



Não consigo avaliar se o jogo é bom ou mau (aliás, o modo "dance off" é apenas uma da cinco secções disponíveis)… mas ver o próprio Darth Vader acompanhado de um punhado de Stormtroopers a dançar em “Kinect Star Wars” é uma experiência surreal e reveladora – além de um dos maiores vilões modernos do Cinema, é também, e certamente, o melhor bailarino.

 

 

 





Se há alguma coisa mais horripilante que “Friday the 13th” só mesmo o seu jogo correspondente, e não pelas razões mais felizes. A possibilidade de jogar com Jason é logo posta de parte – só podemos ir saltitando de jovem vítima em jovem vítima, até a anterior ser estraçalhada pelo vilão… à luz do dia… em câmara lenta. Resumindo e concluindo, eis as nossas duas tipologias de ações: correr e morrer.

 

 

Pontos exta (negativos): temos a possibilidade de ser realmente fieis aos filmes e fazer o papel de vítimas burras que nem uma porta, que em vez de fugir, procuram os assassinos em série.

 

Pontos extra (ainda mais negativos): tecnicamente, era possível acabar o jogo em cerca de três minutos.




 

É sempre ligeiramente injusto fazer pouco de jogos que, claramente, não tinham ainda as grandes potencialidades de hoje ao serviço das suas tecnologias, hoje aparentemente tão pré-históricas que são quase equivalentes a uma pintura rupestre cibernética. De todo o modo, e enquadrando devidamente as disposições da época, continuava a haver bons jogos, maus jogos e péssimas desculpas para gastar eletricidade. “Total Recall” é um infame representante da última categoria.

 

 

Passar de um filme de rating R para um jogo acessível a crianças, não é tarefa fácil… mas daí a transformar o enredo do jogo na tentativa de um gorila indistinto (Arnold Schwarzenegger) cujas duas única linhas de ação são saltos e amostras de murros de escapar a ataques de anões de macacões cor-de-rosa vai um grande pedaço.

 




Há esta coisa no mundo dos jogos cujos enredos vieram transferidos de um sucesso do grande ecrã – espera-se que, de alguma forma, a narrativa apresentava seja mais ou menos fiel à do filme. Se tivermos esta asserção como dogma e se, por hipótese, nunca tivéssemos posto os olhos em “Back to the Future”, ainda hoje acreditaríamos piamente que se tratava da história infortuna de um rapaz que passava a vida a fugir de abelhas assassinas e homens de cor-de-rosa (outra vez!), enquanto aumentava religiosamente a sua coleção de relógios. Às vezes o garoto andava de skate – a parte que, efetivamente, é fiel ao filme.

 

 

Pontos extra (positivos): em caso de intoxicação alimentar, os comandos são tão tremeliques que induzem o vómito com bastante eficiência.

 

 




No espectro “mais surpreendente” da indústria dos jogos inspirados em filmes, há maus filmes que dão origem a bons jogos e há bons filmes que dão origem a maus jogos. Depois há a categoria do buraco negro – maus filmes que dão origem a jogos ainda piores, e que até fazem parecer o mau filme uma obra de arte. É esse o caso de “Charlie's Angels: Full Throttle”.

 

 

Considerado por muitas publicações como “o pior jogo de sempre”, encapsula em si gráficos inacabados, animação pobretanas, gameplay horrífico, paredes invisíveis intransponíveis e um enredo que nem sequer faz lembrar os Anjos, apesar de repetidamente as colocar em lutas acrobáticas capazes fazer Matrix corar em bikinis mínimos.

 




Das duas uma: ou isto é brilhante para lá da compreensão, ou simplesmente perturbador.

 

 

Pontos extra (ambíguos): beba-se um shot de cada vez que se encontra uma personagem semi-nua.




Menções (nem sempre muito) Honrosas


"Catwoman" (PC, GBA, Xbox, PS2, Game Cube)

"Iron Man" (PS2, PS3, PSP, Wii, Nintendo DS, Xbox 360, Mobile, PC)

"Superman 64" (Nintendo 64)

"Raiders of the Lost Ark" (Atari 2600)

"Enter the Matrix" (PC, Game Cube, PS2, Xbox)

"Titanic Rescue" (iOS)

"Cliffhanger" (SNES, NES, Gameboy, Game Gear, Mega Drive, Amiga, Mega CD)

"The Texas Chainsaw Massacre" (Atari 2600)

"A Nightmare on Elm Street" (NES)

"Monty Python & the Quest for the Holy Grail" (PC)

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