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Point-Of-View-Shot - Donnie Darko (2001)

por Catarina d´Oliveira, em 26.02.09

 

"28 days... 6 hours... 42 minutes... 12 seconds. That... is when the world... will end"

 

Se a minha memória não me atraiçoa, o filme com maior orçamento no ano de 2001 foi Pearl Harbour, com mais 150 milhões de Dólares ao dispor.
 
Mas se queremos a prova que para um grande filme não são necessários orçamentos exorbitantes, basta pormos os olhos num pequeno filme independente estreado no mesmo ano, filmado em apenas 28 dias, tendo um orçamento de 4.5 milhões: Donnie Darko.
 
Donnie Darko é um adolescente problemático e perturbado que, apesar de estar sob medicação e terapia, não consegue por fim aos seus estranhos episódios de sonambulismo e alucinação. Num destes episódios, Donnie caminha adormecido para fora de casa deparando-se pela primeira vez com um bizarro personagem que se tornará recorrente nos seus dias futuros.
 
A voz monocórdica e robotizada de Frank, um estranho coelho gigante com a face semelhante à de um insecto (uma autêntica "metáfora andante" dos demónios de Donnie), informa-o de que o mundo acabará em 28 dias.

 

 

Ao regressar a casa, já acordado e sem compreender o significado do “sonho” que acabou de ter, Donnie depara-se com um cenário perturbante: o seu quarto encontra-se completamente destruído por um pedaço de avião cuja origem não conseguiu ser identificada. Se não fosse Frank, estaria, muito provavelmente, morto.
 
Numa sequência de eventos aparentemente incompreensíveis e inexplicáveis, Donnie acaba por formar uma relação doentia com Frank que o manipula e incita à destruição por meio da criatividade, cometendo estranhos actos de vandalismo. Lentamente, o remoinho de pedaços de uma existência conturbada começa a amainar, e as linhas da história começam finalmente a delinear-se e cruzar-se fazendo sentido na perturbada mente de Donnie. Lentamente, descobre as misteriosas leis que regem a sua vida e que levarão o Universo ao fim prematuro.
 
Mas, afinal, será tudo isto um produto da imaginação de  Donnie Darko… ou não?
 
As críticas e apontamentos sobre Donnie Darko serão, provavelmente, das mais procuradas e requisitadas na internet. Porquê? Porque quem assistiu à conturbada história do jovem Donnie tem sede de mais. Mais informação, mais explicações, mais compreensão.

 

 

Lamento, mas nesta crítica não me aventurarei por esses caminhos. Acredito que Donnie Darko é uma obra de culto pronta a ser descoberta por cada um de nós à sua maneira, e acredito ainda que diferentes pessoas o verão de diferentes maneiras, podendo até existir diversas interpretações do desfecho (se é que ele existiu realmente). Nenhum deles está certo, nenhum está errado.

 

E aí mesmo começa um vasto rol de pormenores complexos que tornam Donnie Darko a excepcional e surpreendente peça cinematográfica que é.

 

O título nada dirá da história a quem desconheça o adolescente a que se refere. Porém, momentos após o início da fita, as palavras começam a fazer sentido e damos conta que, afinal, Donnie Darko não é apenas o nome do protagonista mas também uma sucinta descrição deste complexo ser. Donnie é um diminutivo carinhoso e familiar que acaba por evocar a inocência e paixão naturais de um adolescente em crescimento. Darko é a outra face da moeda, o lado escuro, a mente perturbada que tenta e falha ultrapassar várias crises próprias da idade.

 

Com apenas 26 anos, Richard Kelly escreveu e realizou um filme que, apesar da fraca recepção na altura, é hoje um dos mais respeitados filmes de culto da década. O estilo é confiante e único, dando muitas vezes a ideia que a camera flutua juntamente com os personagens, e a narração segue lenta e compassadamente; só o suficiente para construir um enredo tão rico que poderá ultrapassar a humilde compreensão e apreensão lógica do espectador.

 

O que vemos é o mundo aos olhos de Donnie. Além dele, somos os únicos a presenciar os seus actos violentos e as suas confusas alucinações. Só assim e fazendo uso de elementos que alguns poderão considerar "sobrenaturais" ou surreais podemos entrar na cabeça de Darko. O que vemos é o que ele vê, o que um jovem imensamente perturbado e fragmentado vê. Um mundo a desfazer-se à sua frente.

 

Mas esta é ainda uma fita extremamente ácida. Uma corrosiva crítica social que condena os estereótipos juvenis incorporados na exclusão intelectual e relacional de Donnie; os estereótipos que a escola e os pais tentam todos os dias implantar nas cabeças de alunos e filhos, numa lavagem cerebral que os torna tantas e tantas vezes...vazios. Donnie é o grito de libertação, o antónimo dessa constância. Um "rebelde" que só quer aprender por si mesmo o que é a vida e o que ela realmente significa em todo o seu espectro de complexos sentimentos agradáveis ou desagradáveis.

 

 

Jake Gyllenhaal brinda-nos com uma das mais impressionantes interpretações da sua carreira, não se limitando a interpretar um personagem, mas desaparecendo nele. O que vemos no fundo dos seus expressivos olhos azuis, é exactamente um jovem perturbado, afastado do mundo real para o qual não consegue retornar.

 

Outro ponto de imperial destaque são os efeitos especiais de surpreendente avanço e qualidade que, recordo novamente, partem de um reduzidíssimo orçamento de 4.5 milhões de dólares, o que os torna ainda mais espectaculares. Ainda ligado aos efeitos especiais, está a sua utilização directa. A história nunca é guiada por eles, sendo apenas beneficiada pela sua presença, ao contrário do que acontece em muitos blockbusters de Hollywood que vivem do CGI e não das histórias propriamente ditas.

 

Donnie Darko foi e continua a ser um imensamente original filme que combina um enredo intrigante e complexo com uma espécie de ficção científica de alta categoria, permanecendo impenetrável à lógica analítica. Desejamos ardentemente uma explicação, um desfecho, mas, pensando bem, que desfecho poderia haver?

 

Traços de sonho e pesadelo acompanham o dinamismo numa peça que tem muito a dizer sobre a vida...e a morte.

 

Donnie: Why do you wear that stupid bunny suit?

Frank: Why are you wearing that stupid man suit?

 

9/10

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4 comentários

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De Filipe Coutinho a 26.02.2009 às 21:59

Excelente texto como sempre :p

De facto, estamos perante uma obra de culto crucial para qualquer cinéfilo. Apenas pecaste pela não atribuição da nota mais elevada. eh eh

Ah, e depois tens que me dizer se concordas ou não com o que escrevi e, claro, tens que nos fornecer a tua visão da história.

Bjs
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De dana a 01.03.2009 às 14:07

Uma analise fantástica, muito bem estruturada, desde já, deixa-me felicitar-te pelo maravilhoso blog que aqui tens, sem dúvida que é um verdadeiro prazer ler os teus post!
Meus sinceros parabéns e espero que tanto o blog como a tua capacidade de análise critica continuem a crescer. Eu continuarei com a minha visita assídua ao blog.


cump.
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De Catarina d´Oliveira a 01.03.2009 às 20:04

dana,

desde já agradeço sinceramente todo o apoio e elogios! de facto as coisas fluem de uma forma impressionante quando queres falar de algo que te fascina e do qual tanto gostas...é o que se passa comigo em relação ao cinema. Bebo cada segundo como se fosse o último e fico extasiada a cada filme...e que sensação essa! depois é só escrever :)

mais uma vez, muito obrigado pela força e espero que voltes muitas vezes :D
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De Victor Afonso a 02.03.2009 às 22:51

Não sei se sabes mas vai ser feita uma sequela chamada "S. Darko".

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