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"28 days... 6 hours... 42 minutes... 12 seconds. That... is when the world... will end"
Lamento, mas nesta crítica não me aventurarei por esses caminhos. Acredito que Donnie Darko é uma obra de culto pronta a ser descoberta por cada um de nós à sua maneira, e acredito ainda que diferentes pessoas o verão de diferentes maneiras, podendo até existir diversas interpretações do desfecho (se é que ele existiu realmente). Nenhum deles está certo, nenhum está errado.
E aí mesmo começa um vasto rol de pormenores complexos que tornam Donnie Darko a excepcional e surpreendente peça cinematográfica que é.
O título nada dirá da história a quem desconheça o adolescente a que se refere. Porém, momentos após o início da fita, as palavras começam a fazer sentido e damos conta que, afinal, Donnie Darko não é apenas o nome do protagonista mas também uma sucinta descrição deste complexo ser. Donnie é um diminutivo carinhoso e familiar que acaba por evocar a inocência e paixão naturais de um adolescente em crescimento. Darko é a outra face da moeda, o lado escuro, a mente perturbada que tenta e falha ultrapassar várias crises próprias da idade.
Com apenas 26 anos, Richard Kelly escreveu e realizou um filme que, apesar da fraca recepção na altura, é hoje um dos mais respeitados filmes de culto da década. O estilo é confiante e único, dando muitas vezes a ideia que a camera flutua juntamente com os personagens, e a narração segue lenta e compassadamente; só o suficiente para construir um enredo tão rico que poderá ultrapassar a humilde compreensão e apreensão lógica do espectador.
O que vemos é o mundo aos olhos de Donnie. Além dele, somos os únicos a presenciar os seus actos violentos e as suas confusas alucinações. Só assim e fazendo uso de elementos que alguns poderão considerar "sobrenaturais" ou surreais podemos entrar na cabeça de Darko. O que vemos é o que ele vê, o que um jovem imensamente perturbado e fragmentado vê. Um mundo a desfazer-se à sua frente.
Mas esta é ainda uma fita extremamente ácida. Uma corrosiva crítica social que condena os estereótipos juvenis incorporados na exclusão intelectual e relacional de Donnie; os estereótipos que a escola e os pais tentam todos os dias implantar nas cabeças de alunos e filhos, numa lavagem cerebral que os torna tantas e tantas vezes...vazios. Donnie é o grito de libertação, o antónimo dessa constância. Um "rebelde" que só quer aprender por si mesmo o que é a vida e o que ela realmente significa em todo o seu espectro de complexos sentimentos agradáveis ou desagradáveis.
Jake Gyllenhaal brinda-nos com uma das mais impressionantes interpretações da sua carreira, não se limitando a interpretar um personagem, mas desaparecendo nele. O que vemos no fundo dos seus expressivos olhos azuis, é exactamente um jovem perturbado, afastado do mundo real para o qual não consegue retornar.
Outro ponto de imperial destaque são os efeitos especiais de surpreendente avanço e qualidade que, recordo novamente, partem de um reduzidíssimo orçamento de 4.5 milhões de dólares, o que os torna ainda mais espectaculares. Ainda ligado aos efeitos especiais, está a sua utilização directa. A história nunca é guiada por eles, sendo apenas beneficiada pela sua presença, ao contrário do que acontece em muitos blockbusters de Hollywood que vivem do CGI e não das histórias propriamente ditas.
Donnie Darko foi e continua a ser um imensamente original filme que combina um enredo intrigante e complexo com uma espécie de ficção científica de alta categoria, permanecendo impenetrável à lógica analítica. Desejamos ardentemente uma explicação, um desfecho, mas, pensando bem, que desfecho poderia haver?
Traços de sonho e pesadelo acompanham o dinamismo numa peça que tem muito a dizer sobre a vida...e a morte.
Donnie: Why do you wear that stupid bunny suit?
Frank: Why are you wearing that stupid man suit?
9/10