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"Right now we are alive and in this moment I swear we are infinite"
Adolescência. Inescapável no seu alcance, omnipresente no ciclo da vida. Todos já por lá passámos, estamos a passar, ou passaremos.
Tempo da acne. Das guerras com os pais. Das crises de identidade. Das hormonas saltitonas. Da irritabilidade constante. Do inesperado desaparecimento da coordenação corporal. Da revolta. Da irreverência. Do crescimento a pique. Do desenvolvimento sexual.
É sobre isso e muito mais que nos fala uma das estreias da semana, ‘The Perks of Being a Wallflower’, adaptação baseada no romance epistolar homónimo de Stepehn Chbosky publicado em 1999.
O ano é o de 1991, era onde a mixtape substitui o sms na forma mais (im)pessoal de dizer “gosto de ti”, e a história é a de Charlie, um rapaz tímido e solitário que deseja ardentemente que o seu primeiro dia na escola secundária dê uma volta na sua vida pouco feliz. A taxa de sucesso é nula.
Tudo muda, no entanto, com o aparecimento súbito das personalidades coloridas de Sam e Patrick, dois alunos mais velhos e boémios à procura da liberdade no conformismo da adolescência dispostos a deixar Charlie entrar no seu mundo, embarcando juntos num voo alternadamente elevado e rasante da história da adolescência que encapsula graciosamente as complexidades do crescimento de forma graciosa, divertida e compassiva.
Em 1996, Chuck Palahniuk descreveu a insónia no seu romance de ficção transgressiva, “Fight Club”, que “tudo é uma cópia, de uma cópia, de uma cópia”. A mesma linha de lógica poderia ser aplicada a determinados arcos de narrativa, que tão habituados estamos a ver mastigados no Cinema moderno que lhes cheiramos a presença à distância. Eventualmente, e embebidos numa espécie de “zombismo cultural”, chega algo que nos acerta em cheio no estômago e deixa marca.
'The Perks of Being a Wallflower' deixa marca, e deixa-a porque retrata um ciclo tão delicado da vida de uma forma que talvez não fosse vista desde os clássicos adolescentes de John Hughes, onde a cabeça de cartaz é, inequivocamente, 'Breakfast Club'(1985). Marca porque é universal no seu apelo.
Idealmente, e narrativamente falando, o passado de Charlie necessitaria de mais detalhe e reflexão, e o filme acaba por ser vítima de repetição que o tema sofreu ao longo dos anos. Mas colocar “originalidade” na mesma frase que “ritos de passagem” é um caso específico do paradoxo. Se algo não é comum ou generalizado, não pode ser um rito.
'The Perks of Being a Wallflower' é mais um conto de moralidade embutido numa história sobre a angústia de estar preso num corpo (e alma) que já não é de uma criança, mas também não o é de um adulto, e também da saga de um grupo de desajustados que encontram na união a sua máxima força.
O filme de Chbosky (que além de autor do romance, também escreveu o argumento e realizou o filme) revisita, portanto, o género da adolescência escolar sem prescindir de alguns clichés comuns, como a luta no refeitório, o primeiro beijo, ou o professor que faz a diferença. Mas também se diferencia dos demais concorrentes pela sua abordagem intensa e pura, pela sinceridade e talento runido que, juntos, um pouco como o tal grupo de inadaptados, ultrapassa os seus antecedentes óbvios.
O resultado é uma experiência estimulante ainda que frágil, divertida ainda que melancólica, e profundamente real ainda que ficcional.
A realização é levada a cabo com a convicção e preocupação de alguém que conhece profundamente esta história melhor que ninguém. E a banda sonora, tamgém digna de nota, é um mergulho nostálgico com escolhas cool que vão desde The Smiths e David Bowie a Dexys Midnight Runners.
Logan Lerman, mais conhecido pela sua participação em “Percy Jackson”, conta aqui com o seu trabalho mais sólido e agraciável até ao momento dando ao protagonista uma característica de observador nato muito naturalista, que esconde uma alma triste e torturada, em busca da liberdade.
Se existe algum equivalente à apropriação indébita no universo cinematográfico, então Ezra Miller é considerado culpado. O jovem ator que pasmou meio mundo com o diabólico Kevin em “We Need to Talk About Kevin” atua num polo energético oposto aparecendo completamente metamorfizado numa performance inteligente e absolutamente magnética como o colorido Patrick.
Por último, mas não menos importante, Emma Watson não deixa de aparentar ser ligeiramente refinada demais para o papel de bad girl, mas deixa aqui a prova resoluta de que é capaz de deixar de lado a capa e a varinha mágica e embarcar na aventura de outras paragens Muggles.
O restante elenco secundário – onde se incluem Paul Rudd, Kate Walsh, Dylan McDermott e Joan Cusack – é igualmente digno de nota e apreço.
Talvez os problemas destes mini-hipsters não reflitam a vossa experiência na adolescência com qualquer rigor ou semelhança assinalável, mas há uma espécie de genialidade sensitiva na forma como 'The Perks of Being a Wallflower' toma a realidade aumentada do cosmos adolescente, onde todos os microscópicos movimentos têm um significado e uma consequência, e onde um momento íntimo único é capaz de desvendar os mais majestosos segredos escondidos do universo. Como a própria adolescência, é também negro e complexo na exploração da sua profundidade emocional e social.
Mas de alguma forma, a crença que fica é que 'The Perks of Being a Wallflower' não podia nem deveria ser perfeito, porque tal como a fragilidade humana que carrega nos seus 100 minutos, deve ser gretado, ferido, incompleto mesmo, pelo seu posicionamento no macrocosmos da vida. Deve magoar e marcar.
Adolescência. Inescapável no seu alcance, omnipresente no ciclo da vida. Todos já por lá passámos, estamos a passar, ou passaremos.
Tempo da descoberta. Da originalidade das mixtapes. Da imortalidade do ser. Da amizade. Do Amor. Do inifinito da vida.
9.0/10