
O Cinema não é apenas uma arte ou um meio de expressão ou entretenimento; é também uma escola. Posso dizer hoje com muita segurança, que ao longo de vários anos e centenas de filmes, muito do que sei, aprendi-o em frente a um ecrã.
Lições de vida, lições sobre a natureza humana e de outros seres e, sem dúvida, lições tecnológicas, científicas e históricas. Neste post, e provavelmente em mais um ou dois futuros, deter-me-ei neste último ponto: lições históricas.
O filme histórico, ou drama histórico se preferirmos, é um género cinematográfico que se traduz no conjunto de fitas baseadas em eventos históricos ou personalidades mais ou menos famosas. Podemos dividi-lo em três grandes sub-grupos aos quais tomo a liberdade de chamar filmes históricos fiéis, enfeitados ou ficcionais.
No primeiro caso, temos histórias que, dentro dos possíveis da pesquisa moderna, retratam fielmente um envento ou personalidade. No segundo caso, o enredo é maioritariamente verdadeiro historicamente com alguns extras em prol de uma melhor fluidez e maior interesse. Por último, no terceiro caso, embora o cerne ou grande base do filme seja um acontecimento ou personalidade reais, o enredo é algo altamente novo e ficcional.
Contudo, o que parecia ser uma frutífera e ao mesmo tempo divertida aula de história que desenvolvia inconscientemente o intelecto, pode revelar-se uma engenhosa armadilha que nos poderá levar a cometer erros, digamos que... vergonhosos.
Estamos já a chegar ao busílis da questão... até que ponto os filmes históricos são fiéis aos verdadeiros acontecimentos? Até que ponto poderemos nós acreditar e aceitar como conhecimento aquilo a que assistimos? Bom, estas são perguntas que não têm resposta fácil.
Antes de prosseguir com algumas análises gostaria de lembrar que, por vezes, as “alterações” nos acontecimentos não se dão por pura ignorância do realizador e argumentistas (o que também acontece, infelizmente, muitas vezes). O que se passa é que, com vista a um produto mais aliciante, seja, neste caso, um filme mais interessante, alguns elementos têm de ser forçosamente alterados por não funcionarem cinematográficamente, pelo que certas mudanças são compreensíveis e até certo ponto aceitáveis.
Mas como eu aqui no Close-Up sou uma defensora ávida da verdade e do conhecimento, deixo-vos com algumas coisas que aprendi quando confrontando um filme com o seu respeitante pano de fundo
(Nota: muitos outros “erros” não são aqui apontados tendo-me resumido aos que mais saltam à vista).

- Por mais fascinante que possa ter parecido no ecrã, o Kilt escocês data do séc. XVI, cerca de 300 anos depois da história de Wallace.
- A paixão e tórrida relação de Wallace e Isabelle que vimos no filme é terrivelmente dificultada pelo facto de, na realidade e na altura em que a acção se desenrola, a princesa ter pouco mais de 2 anos.
- A mesma impossibilidade está presente na questão de Eduardo III ser filho de Wallace já que, historicamente, este só nasceu 7 anos depois da sua morte.
- Wallace não era um qualquer cidadão comum que emergiu dos fundos para liderar a grande revolução. Na verdade, era um respeitado cavaleiro possuidor de terras próprias que nasceu no seio de uma família nobre.
- A tinta usada pelos escoceses que provém da planta Pastel não foi realmente usada pelos Escoceses mas sim pelos Celtas, sendo que, pela altura de Wallace, já tinha caído em desuso.

- O reinado de Commodos foi bem sucedido durante 13 longos anos, ao contrário dos decadentes e escassos (talvez) 2 anos apresentados no filme.
- Commodos era casado e não assassinou o pai Marco Aurélio.
- Ainda sobre Commodos, este não foi morto na arena mas sim numa banheira (por um wrestler chamado Narciso)
- O cão de Maximus é um pastor alemão, raça que não existia na altura.
- As mulheres não podiam frequentar o Coliseu. Os romanos consideravam-nas uma distracção para os homens.
- As catapultas não seriam usadas num alvo em movimento; eram pesadas e, no caso de falharem o alvo, levavam muito tempo a reajustá-lo.
- Roma foi fundada como uma Monarquia e não como República.
- A Guerra de Tróia durou 10 anos e não alguns dias.
- Menelau e Agamemnon não morreram em Tróia. O último foi mesmo morto pela mulher, Clitemnestra em Argos.
- Helena não abandonou Menelau por ele ser feioso, velho ou mau. A verdadeira questão é que, segundo a lenda, Helena era a mulher prometida a Paris por Afrodite se este a elegesse a deusa mais bela. As opiniões dividem-se, e isso sim, entre aqueles que acreditam que Helena foi levada à força por Paris ou e aqueles que acreditam que foi de sua própria vontade.
- Pátroclo não era primo de Aquiles mas sim seu amigo (há quem até o indique como seu amante)
- Aquiles não estava no Cavalo de Tróia. Na verdade, por essa altura já tinha sido morto por Páris.
- Heitor não matou Ajax, este cometeu suicídio.
- Houve algumas discussões quanto ao local exacto onde as moedas de bronze deveriam ser colocadas nos mortos (boca, olhos...). Contudo, levanta-se um problema ainda maior...é que, pela altura da guerra, ainda faltavam cerca de 500 ou 600 anos para as moedas serem inventadas.
- Os trirremes em que os Gregos chegaram às praias de Tróia só seriam inventados cerca de 500 anos depois.
A continuar...