
"Lady Spencer: All of London is talking...
Georgina, The Duchess of Devonshire: Oh...let them talk!"
Entre muitas outras, existem três coisas que venero em cinema: filmes ingleses, filmes sobre mulheres fortes e filmes históricos. É então tão somente natural que um filme que junte estes três elementos faça imediatamente disparar os alarmes nas minhas anteninhas cinematográficas.
As origens e as árvores genealógicas sempre foram algo de crucial importância na cultura inglesa. Não é por isso de estranhar o burburinho sempre que se menciona a “escandalosa” vida de Georgiana Spencer, já que Diana de Gales é sua descendente, sendo, em alguns pontos, a versão moderna da mesma história. Só talvez menos interessante e mais sensível por ainda ser relativamente recente. Assim sendo, The Duchess é um belo retrato histórico do final do séc. XVIII que se centra na vida de Georgiana Cavendish, Duquesa de Devonshire.
Com o nome feito pelos seus bafejantes carisma e beleza, Georgina teve alguns problemas devido às suas atracções pela extravagância, jogo e amor. Numa época em que era obrigatório casar com um bom partido, Georgiana teve a “sorte” de atrair o interesse desinteressado do Duque de Devonshire que desespera pelo nascimento de um filho varão. Num casamento marcado por constantes traições e insultos do marido, Georgiana acaba por se tornar uma socialite poderosa, um ícone da moda, uma mãe devota e uma activa operadora política feminista e adorada pelo povo.
Mas a vida perfeita aos olhos das gentes esconde uma desesperada busca por amores impossíveis: por um lado, o apaixonado romance com Earl Grey - futuro Primeiro Ministro. Por outro, o inesperado e vicioso triângulo amoroso inescapável com o seu marido e a sua nova melhor amiga, Lady Bess Foster.
The Duchess não é uma daquelas histórias de amor ao estilo de Jane Austen; é antes um retrato violento e realista de um sistema rígido e preconceituoso (especialmente em relação às mulheres), onde cada peão se move usando todas as possíveis, aceitáveis ou inaceitáveis, armas.
Todo o elenco está em perfeita sintonia, mas os dois protagonistas são soberbos. Fiennes, numa devastadora performance ao seu mais alto nível, faz o mais difícil: descobre cada detalhe, cada vértice que nos faz compreender o que move realmente o Duque de Devonshire nas suas acções mais ou menos humanas, sem nunca o representar como um puro vilão sem escrúpulos. Um deleite.
E depois há Keira Knightley, que se em Atonement partilhava os louros com James McAvoy (e até com a pequena Saoirse Ronan), pode reclamar The Duchess como quase absolutamente seu. Há um qualquer fogo-fátuo inextinguível em si que espalha graça e desgraça por Georgiana, revivendo-a como a escandalosa porém heróica mulher que foi.

Incomodar-me-á realmente se The Duchess for deixado de fora dos Óscares. Admito a dificuldade das categorias principais, como Melhor Filme, pela competição cerrada que se adivinha este ano. No entanto, se ainda há discernimento e justiça, terá pelo menos algumas distinções técnicas, como Guarda-Roupa, Música ou Direcção Artística que são manejadas com absoluta mestria. Não acredito muito numa nomeação para Maquilhagem já que me pareceu ter sido dada muito pouca importância ao fenómeno de envelhecimento de Georgina, por exemplo. E apesar de também se esperar uma “sangrenta” luta entre grandes senhoras na categoria de Melhor Actriz, Keira Knightley merecia pelo menos o seu lugar estrelado entre as cinco.
No entanto, a verdade é que a Georgina que vemos no ecrã não é necessariamente aquela que viveu realmente um dia neste mundo. Essa verdadeira Georgina era sim inteligente e amada, mas também alguém com demarcadas falhas; alguém que tinha sérios problemas com o jogo e a bebida e que acabou por morrer afundada em dividas. Falhas estas que só muito superficialmente foram abordadas, tornando uma personagem potencialmente brilhante em "apenas" interessante.
The Duchess é assim um filme bom, interessante. Mas é, acima de tudo, um desperdício. Um filme onde aqueles que o dirigiram, ao contrário da protagonista, tiveram medo de arriscar. Um filme que, a terem realmente querido, teria sido memorável em vez de bom.
8/10